sábado, 11 de setembro de 2010

Eis aqui a origem das desigualdades entre os homens

ROUSSEAU, Jean-Jacques. A origem da desigualdade entre os homens. [1] Trad. Ciro Mioranza. 2. ed. São Paulo: Escala, 2007.

O primeiro que, cercado um terreno, se lembrou de dizer ‘Isto é meu’ e encontrou pessoas bastante simples para o acreditar, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil. Quantos crimes, guerras, assassinatos, misérias e horrores não teriam sido poupados ao gênero humano aquele que, arrancado as estacas ou tampando o fosso, tivesse gritado a seus semelhantes: ‘não escutem esse impostor! Vocês estarão perdidos se esquecerem que os frutos são de todos e que a terra é de ninguém!

  1. Diante da questão proposta pela Academia de Dijon: Qual é a origem da Desigualdade entre os homens e se é autorizada pela lei natural? Rousseau, contratualista francês do século XVI, inicia afirmando que essa é uma pergunta complexa, pois como conhecer o início das desigualdades entre os homens se não se conhece o próprio homem? E que este foi lapidado ao longo dos séculos, assim como uma estátua a beira do mar sendo frequentemente desfigurada pelas ondas. O homem não é mais como era, ele foi lapidado fisicamente, moralmente e mentalmente.
  2. No início somente existe uma lei, a Lex naturalis e que essa lei deve ser inerente a apenas os homens, pois são os únicos capazes de reconhecê-la. Por outro lado o Direito Natural – Jus naturalis – deve ser aplicado a todos os seres, devido este não se basear na razão e sim na sensibilidade e isto tanto o homem quanto o animal possuem. Os animais pelo menos devem possuir “o direito de não ser maltratado inutilmente pelo outro.”.
  3. Existem duas formas de desigualdades, afirma Rousseau: “Uma que chamo de natural ou física porque é estabelecida pela natureza e que consiste na diferença das idades, da saúde, das forças do corpo e das qualidades do espírito ou da alma. Aoutra que pode ser chamada de desigualdade moral ou política porque, depende de uma espécie de convenção e que é estabelecida ou pelo menos autorizada pelo consentimento dos homens. Esta consiste nos diferentes privilégios de que gozam alguns em prejuízo dos outros, como ser mais ricos, mais honrados, mais poderosos do que os outros ou mesmo fazer-se obedecer por eles ”.
  4. O homem de Rousseau é diferente do de Hobbes, para o último o homem era mesquinho, mau, selvagem e para o primeiro trêmulo e medroso, incapaz de causar mal para retirar disso proveito próprio, ele sequer sabia distinguir o que seria mau e o que não seria. Este homem visto como um animal constitui o que se convencionou chamar de “Bom selvagem”.
  5. Com o tempo o homem selvagem que não difere por nada dos animais aprende a não temê-los, mas muitas das características se mantém. “Nenhum animal faz guerra ao homem fora do caso de sua própria defesa ou de fome extrema.” Assim também era o homem sem ser por causa de alimentação ou por sofrer uma ameaça ele não iria contra a vida de nenhum outro ser.
  6. A primeira diferença enumerada entre os animais e os homens é o fato que os últimos possuem consciência da sua liberdade com relação à natureza. A natureza ordena todos os animais, exceto o homem. Outra diferença segundo Rousseau é a capacidade de se aperfeiçoar.
  7. Para Rousseau existe um sentimento que é inerente aos animais e aos homens a Piedade e que esta impede o homem de ser um monstro. Pode se dizer que a piedade é uma lei natural. Ao explanar sobre amor Rousseau afirma não ser ele causa de desigualdade, nem de conflitos, pois existiam mais mulheres do que homens e que não havia nenhuma competição amorosa.
  8. Para Rousseau no estado de natureza não existe nenhuma desigualdade a não ser a natural, mas quando afinal surgiu a desigualdade entre os homens? Talvez uma das passagens mais conhecidas da obra de Rousseau e com ela ele inicia a segunda parte do Discurso, afirmando ser a propriedade privada a causa de todos os males da humanidade e o motivo pelo quais os homens se tornaram tão desiguais. “O primeiro que, cercado um terreno, se lembrou de dizer ‘Isto é meu’ e encontrou pessoas bastante simples para o acreditar, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil. Quantos crimes, guerras, assassinatos, misérias e horrores não teriam sido poupados ao gênero humano aquele que, arrancado as estacas ou tampando o fosso, tivesse gritado a seus semelhantes: ‘não escutem esse impostor!Vocês estarão perdidos se esquecerem que os frutos são de todos e que a terra é de ninguém!.’”.
  9. Rousseau afirma que o primeiro sentimento do homem foi o de sua existência e o primeiro cuidado, o da sua conservação. O homem descobre que é capaz de refletir ou nas palavras do filósofo descobre “uma prudência maquinal que lhe indicava as precauções mais necessárias à sua segurança.”.
  10. Com o passar dos tempos o homem passou a dominar os animais e acabou por se ver como ser vivo, passou também a distinguir os sexos (macho e fêmea). “Foi assim que o primeiro olhar que lançou sobre si mesmo produziu nele o primeiro movimento de orgulho.”
  11. “Os homens, até então errantes nos bosques, tendo adquirido uma situação mais fixa, aproximan-se lentamente, reúnem-se em diversos grupos e formam, enfim, em cada região uma nação particular, unida pelos costumes e pelos caracteres, não por regulamentos e por leis, mas pelo mesmo gênero de vida e de alimentos e pela influencia comum do clima.”. O homem sai do Estado de natureza e com o sentimento de consideração e de obrigação surge a VINGANÇA.
  12. Torna-se menos tolerante, menos piedoso. E a piedade que era a Lei natural no estado de natureza se torna insuficiente “era preciso que as punições se tornassem mais severas à medida que as ocasiões de ofender se tornassem mais freqüentes; e que, por causa do terror das vinganças, se tornava necessário o freio leis.”.
  13. Se a terra não pertencia a ninguém como era se tornaria propriedade privada? Através do trabalho. E nesse momento os homens que antes pensavam no próprio dia, passaram a pensar no futuro. A partir desse momento sucedeu-se o progresso das línguas, a desigualdade das fortunas, o uso e abuso das riquezas... E o homem deixa de ser o que parece ser, ou melhor, o que antes ele era agora não mais.
  14. Surgem não os fracos e os fortes, mas sim, os ricos e os pobres e com isso a servidão. A piedade, única lei até então é substituída pela lei do mais forte. “Levantava-se entre o direito do mais forte e o direito do primeiro ocupante um conflito perpétuo que só terminava por meio de combates e de assassinatos.”.
  15. Houve então um Estado de guerra entre os homens, entre ricos e pobres. O homem já tinha desenvolvido como dito antes aquela prudência maquinal e os ricos a usaram em seu mais terrível plano já visto até hoje. Percebendo que a guerra não lhes era benéfica, pois tinham que arcar com grandes custos e no mais havia o risco de vida eminente. As suas propriedades poderiam ser tomadas pelos pobres, pois não havia nada que garantisse a eles sua posse a não ser a força.
  16. Dessa forma maquinou o seu plano. O mais terrível da humanidade. “O rico, premido pela necessidade, concebeu enfim o projeto mais refletido que jamais penetrara em seu espírito humano, o de empregar em seu favor as próprias forças daqueles que o atacavam, de tornarem defensores seus adversários, de lhes inspirar outras máximas e de lhes dar outras instituições que lhes fossem tão favoráveis quanto o direito natural lhe era contrário.”.
  17. E assim os ricos fizeram o seu discurso, afirmando ser necessário criar leis e uma instituição que fizesse com que elas fossem compridas, criar um estado, sair do estado de natureza e se tornar uma sociedade, organizada em volta de um poder maior. E assim foi o discurso que “sujeitaram para o futuro todo o gênero humano ao trabalho, à servidão e a miséria.”.
  18. Essa foi a origem da sociedade e da lei as quais destruíram a liberdade natural e fixaram a lei da propriedade e da desigualdade. Eis o eloqüente discurso: “Vamos unir-nos para livrar da opressão os fracos, conter os ambiciosos e assegurar a cada um a posse daquilo que lhe pertence. Vamos instituir regras de justiça e de paz, às quais todos sejam obrigados a se conformar, que não façam acepção de pessoas e que de certo modo reparem os caprichos da fortuna, submetendo igualmente o poderoso e o fraco a deveres mútuos.
  19. Numa palavra, em vez de voltar nossas forças contra nós mesmos, vamos reuni-las num poder supremo que nos governe segundo leis sábias, que proteja e defendo todos os membros da associação, que rechace os inimigos comuns e nos mantenha numa eterna concórdia.”. E esse discurso seduziu os demais hímens e assim correram para perder a liberdade e o direito de lutar contra as desigualdades.
  20. “Todos correram para submeter-se aos grilhões, acreditando assegurar a própria liberdade porque, com bastante razão para perceber as vantagens de um estabelecimento político, não tinham bastante experiência para prever os perigos dele.”.
  21. E os pobres perderam a única coisa que lhes restava a liberdade. “Porque os pobres nada tendo a perder senão sua liberdade, seria grande loucura que eles deixassem tirar-lhes voluntariamente o único bem que lhes restava para nada ganhar em troca; ao passo que os ricos sendo, por assim dizer, sensíveis em todas as partes se seus bens, era muito mais fácil prejudicá-los; por conseguinte, tomavam maiores precauções para se garantirem.’.
  22. Assim como o filósofo afirma nesse parágrafo: “A ambição dos principais aproveitou-se dessas circunstâncias para perpetuar seus cargos em suas famílias; o povo, já acostumado à dependência, ao repouso e às comodidades da vida e já incapaz de romper os grilhões, consentiu em deixar aumentar sua servidão para fortalecer sua tranqüilidade.
  23. Foi assim que os chefes, tornando-se hereditários, se acostumaram a olhar sua magistratura como um bem de família, a se considerarem eles mesmos como os proprietários do Estado, do qual não eram a princípio senão seus ofícios, a chamar seus concidadãos seus escravos, a contá-los como gado no número das coisas que lhes pertenciam e a proclamar-se a si mesmos iguais aos deuses e reis dos reis.”. Para Rousseau existiu um progresso da desigualdade e que cada uma delas legitimizou um dualidade da desigualdade “o estabelecimento da lei e do direito de propriedade foi seu primeiro termo, a instituição da magistratura o segundo e que o terceiro e último foi a mudança do poder legítimo em poder arbitrário.
  24. De modo que a condição de rico e de pobre foi autorizada pela primeira época, e a de poderoso e de fraco pela segunda e a terceira a de senhor e de escravo que é o último grau de desigualdade e o termo ao qual chegam finalmente todos os outros, até que novas revoluções dissolvam completamente o governo ou o aproximem da instituição legitima.”. Por fim temos como se deu o início da desigualdade entre os homens assim como Rousseau deduziu e argumentou racionalmente que foi.
  25. No final do Discurso ele nos oferece uma máxima:
“Essa é, como efeito, a verdadeira causa de todas essas diferenças; o selvagem vive em si mesmo; o homem sociável, sempre fora de si, não sabe viver senão na opinião dos outros e, por assim dizer, exclusivamente de seu julgamento que tira o sentimento de sua própria existência.”.

Assim, se encera a síntese Da origem da desigualdade entre os homens, a desigualdade como foi provado por Rousseau é ilegítima e só se tornou legítima pelo consenso dos homens e esta legitimidade retirou dos pobres a capacidade e o poder de lutar contra a sua situação.
A natureza nos mostra que somo iguais, obviamente não me refiro as características físicas e nem aos comportamentos individuais. A igualdade a que me refiro foi aquela que existia antes da sociedade, nas palavras de Rousseau, aquela presente no estado de natureza, onde o ser humano tem como direito inalienável a liberdade e como única lei a piedade.

[1] Discours sur L’Inégalité Parmi Les Hommes, Et Se Elle Est Autorisé Para La Loi Naturelle.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Economia Solidária

Por muitos anos vivemos sob o aspecto do capitalismo selvagem e sua busca eterna pelo lucro, explorando o máximo dos recursos naturais e humanos contribuindo para o aumento da desigualdade, em reposta isso, começa a surgir uma alternativa econômica: a economia solidária, que não deixa de gerar lucros, mas não explora os recursos de forma destrutiva.
A economia solidária se situa no seguinte tripé: Cooperação, Autogestão e Solidariedade.
Ela se consolida através de um sistema de cooperativismo, que busca a integração social, ou seja, ela é realizada pela união de pessoas com interesse coletivo que participam e respondem para conseguir os objetivos necessários ao bem da associação como um todo, gerando oportunidades iguais a todos sem esquecer do respeito para com a comunidade que integra.
Outro ponto importante a ser analisado consiste também ao apelo ao meio ambiente através da busca por um desenvolvimento sustentável, trazendo uma economia que busca um meio ambiente saudável, não esquecendo das gerações futuras.
Enfim a economia solidária não deixa de ser uma economia viável ao sistema capitalista em que sobrevive podendo trazer lucros, mas de forma consciente.

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